segunda-feira, 2 de março de 2009

Póvoa de Varzim

Luiz Antonio de Assis Brasil*

Para quem gosta de Eça Queirós a cidade acima não é estranha: foi onde nasceu o autor de Os Maias. Só esse fato já seria motivo de orgulho para os povenses. Mas não, eles vão além: há 10 anos criaram um dos maiores eventos literários mundiais, denominado Correntes D´Escritas. Se pensarmos em termos ibéricos, é o maior. Para comemorar a década, a Câmara Municipal, tendo o apoio de toda a comunidade, especialmente do Cassino da Póvoa, reuniu neste mês 120 escritores de expressão lusa e castelhana. A representação gaúcha contava com nada menos de seis autores, a maioria dentre os brasileiros. Durante quatro dias, lançaram-se livros e discutiram-se todos os aspectos que envolvem o “fazer literatura” numa língua cujo número de usuários cresce a cada dia e que agora, com a ortografia unificada, ganha ainda maior relevo. Mas não só: o Correntes foi, não sendo seu propósito inicial, um espaço de negócios; ali estiveram presentes inúmeros agentes literários, à caça de autores que pretendem ver publicados na Europa. Foi possível observar, no lobby do hotel, uma atividade fervilhante: eram escritores tratando de seus contratos.
De um modo geral, deu para perceber algumas constantes: em primeiro lugar, que a literatura em língua portuguesa está num de seus melhores momentos, com profusão de autores e, o principal: autores que são lidos em ambos os lados do Atlântico. Em segundo, que começa a haver um espaço para os autores menos citados – o leitor português já sabe que nossa literatura vai além de Jorge Amado e Paulo Coelho. E nós, de cá, sabemos que há portugueses que quebram a díade Fernando Pessoa e José Saramago. Podemos ainda acrescentar a importância que vem assumindo a poesia na literatura contemporânea. Os saraus poéticos animavam a noite de Póvoa de Varzim, sempre com enorme assistência. O público, aliás, foi exemplar, concorrendo ao Auditório Municipal, e eram pessoas de todos os lados de Portugal, para além de outros europeus.
O Correntes D´Escritas não é um evento aparatoso, nem solene, nem conta seu sucesso pelo número de participantes (que é enorme, diga-se): é um evento em que a leitura e a literatura estão em primeiro lugar; ademais: não há estrelas; os escritores convidados não buscam protagonismo, nem há clima para isso. Enfim, é um evento humano, o qual pode servir de modelo aos nossos.
*Escritor
ZH, 02 de março de 2009

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