quarta-feira, 8 de julho de 2009

Prefiro os sonhos do futuro à história do passado

Isaac Roitman*

Os sonhos se dissipam rapidamente nos momentos de vigília. Ficam os fatos essenciais e perdem-se os detalhes. No entanto, vou ousar relatar um sonho, embora sabendo que omitirei pontos importantes. Sonhei ter lido jornal datado na segunda ou terceira década do século 21 que dizia mais ou menos isto:
“Ao contrário do que acontecia no Brasil no início do século 21, onde as desigualdades profundamente enraizadas persistiam na educação, condenando milhões de crianças a ter suas oportunidades diminuídas e condenando a maioria delas à pobreza, tudo mudou. Esse foi o destaque do relatório recente da Unesco, revelando uma transformação radical na educação brasileira.
Todas as crianças brasileiras têm atualmente a oportunidade de cursar um ensino básico público de qualidade, reconhecido entre os melhores do mundo, segundo avaliações internacionais. O ensino profissional e superior, devido às reformas feitas em torno do ano de 2010, mudaram completamente as perspectivas sociais e econômicas do país. A formação de doutores garantiu um salto no desenvolvimento científico e tecnológico.
Além da contribuição ao saber, nossos cientistas transformaram o país em líder na inovação, o que é revelado pelo alto número de patentes originadas do país. Os nossos doutores atualmente tem uma formação técnica de alta qualidade e uma consciência profunda de responsabilidade social. O ideário de que a ciência poderia ser agente de transformação social tornou-se uma realidade. A sociedade brasileira compreendeu que o conhecimento científico é o capital mais importante do mundo civilizado. A expectativa é que em 30 anos não haverá mais desigualdade social no Brasil.
Especialistas atribuem essa verdadeira revolução na educação a uma série de ações implementadas. A primeira, com o apoio da maior parte da sociedade, foi a transformação da política de educação em política de Estado, o que garantiu a continuidade de projetos de longo prazo. Após a universalização e obrigatoriedade do ensino básico, fundamental e médio de qualidade, para toda a população, medidas introduzidas na primeira década do século 21 provocaram um salto na qualidade da educação.
Nesse novo contexto, a educação procura preparar o estudante para atender as necessidades e oportunidades que ocorrem a cada momento. A educação científica, em conjunto com a educação social e ambiental, permite que o estudante explore e entenda o que existe ao seu redor nas diferentes dimensões: humana, social e cultural. A educação básica se tornou em um cenário para a definição de conceitos e conhecimentos.
O estímulo à curiosidade, o prazer pela leitura, o ambiente lúdico e o exercício de atividades que estimulam a concentração e o raciocínio, feitas a partir dos primeiros anos de vida, mostraram serem fundamentais para uma postura dos estudantes aberta a novos conhecimentos e ao prazer no aprender. A formação de grande número de professores para o ensino básico foi importante momento nessa transformação. As instituições de ensino superior públicas tiveram papel fundamental na formação do novo professor, que abandonou a postura do antigo professor, de simples agente depositário de conhecimento por meio de suas exposições em sala de aula.
Esse novo professor é um parceiro do estudante, estimulando em todos os momentos a sua formação intelectual e modulando um comportamento civilizado, baseado em princípios morais e éticos. Gradativamente, o professor foi cada vez mais reconhecido pela sociedade. Esse reconhecimento foi manifestado por uma melhoria gradativa em seu salário, hoje um dos melhores do serviço público. O conteúdo nos diferentes segmentos da educação passou a ser redefinido de forma continuada, acompanhando as novas oportunidades e a rápida expansão dos conhecimentos científicos.
O giz e o quadro negro amplamente utilizados no século 20 foram substituídos por instrumentos e metodologias educativas contemporâneas. A educação a distância incorporou-se definitivamente ao conjunto de instrumentos pedagógicos, facilitando o processo de democratização da educação. Ao contrário do que ocorria no passado, agora o estudante acorda cedo e vai acordar o pai ou a mãe dizendo: ‘Vamos acordar, que eu quero chegar logo na escola’”.
Esse foi o sonho. Só me resta repetir as palavras de Thomas Jefferson: “Eu prefiro os sonhos do futuro à história do passado”.
*Membro Titular da Academia Brasileira de Letras

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