segunda-feira, 10 de maio de 2010

Redes sociais

Entrevista - Carolina Terra
Doutora em interfaces sociais da comunicação pela USP, a relações públicas explica como a corrida de empresas e outras instituições rumo às redes sociais só pode alcançar bons resultados se for feita com cuidado e estrutura adequados


Começou como uma febre entre os adolescentes. Milhares de jovens de todo o mundo criaram seus perfis, adicionaram amigos e se uniram em comunidades virtuais dos mais diversos tipos. Não demorou muito, entretanto, para que diversas instituições percebessem o potencial da internet e se rendessem ao fantástico mundo das redes sociais. Nessa corrida pela conquista do ciberespaço, entidades tradicionais, como o Supremo Tribunal Federal e a Petrobras, criaram blogs e contas no Twitter, sempre de olho nos cliques de seus usuários.
No entanto, muitas empresas acabam se perdendo no labirinto virtual. “A gente vê um punhado delas aderindo às redes sociais de qualquer jeito, achando que esse é o caminho para a solução de todos os problemas. Muito pelo contrário”, avisa a relações públicas Carolina Terra, doutora em interfaces sociais da comunicação pela Universidade de São Paulo (USP) e autora do livro Blogs corporativos: modismo ou tendência?.
A especialista de 30 anos lembra que, antes de se aventurar nas redes sociais, é preciso entender o que o público-alvo da empresa espera dos produtos e serviços e fazer um planejamento minucioso, com a ajuda de profissionais qualificados. Carolina estará em Brasília amanhã para uma palestra a estudantes e empresários (veja serviço). Ela falou ao Correio sobre a explosão dos perfis corporativos e sobre a mudança de paradigmas promovida pela comunicação digital.



Necessidade de planejamento


O que a gente vê é um punhado de instituições aderindo
às redes sociais de qualquer jeito,
achando que esse é o caminho para a solução
de todos os problemas.
Muito pelo contrário”


Nos últimos anos, assistimos a um crescimento do número de sites, blogs e perfis corporativos. Para que serve todo esse investimento no mundo digital?
A primeira função da comunicação digital é a interação, fazer com que a empresa se aproxime dos usuários. Se você tem um relacionamento positivo com seus clientes na web, acaba tendo também melhorias de imagem e reputação. Porém, as marcas que têm mais seguidores são as já consagradas pela mídia tradicional. Não é à toa que vemos tanta gente no Twitter de artistas da Rede Globo ou de marcas como a Unilever.

Mas todas as instituições devem estar na web?
É preciso analisar a audiência de cada empresa. Se o público da organização não está na internet, não faz muito sentido investir nisso. Ou então será necessário um grande trabalho prévio de conscientização dos clientes para que eles possam aderir às redes sociais. Mas, em um futuro não tão distante, todo esse público que hoje é jovem e acessa massivamente a internet vai se tornar consumidor. Assim, pode ser que o uso das redes sociais se torne um caminho necessário para todas as organizações.

Muitas entidades tradicionais acabaram se antecipando a esse futuro. Hoje instituições como a Presidência da República têm seu blog ou conta no Twitter. Você acha que está havendo uma mudança na forma de as organizações se comunicarem?
Eu acredito que está havendo uma revolução, sim. Mas é necessário lembrar que as redes sociais não precisam atender a todo o público-alvo, podem ser para um nicho, uma parcela da audiência usuária dessa ferramenta de comunicação. Uma das vantagens é que dá para fazer comunicação bastante dirigida com as redes sociais, e isso é o mais interessante. Outro aspecto é o da mensuração. É muito mais fácil verificar o resultado de comunicação digital do que um de comunicação tradicional. Você sabe quantas visitas determinado apelido teve, quantas pessoas replicaram um post, quantas usuários se engajaram em torno de uma causa por mês na web. Isso atrai as empresas, é uma forma de provar que essa ferramenta dá certo.

E isso é interessante no Brasil, um país onde as taxas de acesso à internet são baixas?
Isso é paradoxal. O Brasil é heavy user, uma das nações onde as pessoas mais passam tempo navegando nas redes sociais. Somos o segundo país em acessos ao YouTube e o que mais lê blogs diariamente. Ainda não existe nenhuma pesquisa específica que fale das redes sociais do mundo corporativo, mas nossos números indicam que a internet é um mercado promissor e que o brasileiro, de fato, gosta das redes sociais para se relacionar.

Então você recomenda que, daqui para frente, as empresas entrem para o mundo virtual?
Com uma boa dose de planejamento. O que a gente vê é um punhado de instituições aderindo às redes sociais de qualquer jeito, achando que esse é o caminho para a solução de todos os problemas. Muito pelo contrário. Quando você entra numa rede social, enfrenta uma enxurrada de reclamações, porque as pessoas entendem que aquele é um canal de comunicação. Muita gente vai usar esse espaço para falar. Para dar certo, é preciso ter estrutura, gente especializada para lidar com isso.
Você pode citar alguns casos de empresas que souberam usar essa ferramenta?
O Boticário é uma empresa que usa muito as redes sociais, tem perfis em várias delas e aproveita esse espaço para se relacionar com os clientes. Outro exemplo interessante é o de uma empresa de engenharia de São Paulo que chegou a vender um apartamento de R$ 500 mil pelo Twitter. Em outra situação, uma produtora que fazia conteúdos de entretenimento para TV lançou DVDs e os comercializou pelo Twitter. O que também é bastante paradoxal, porque hoje em dia todo mundo baixa conteúdo da internet.

Com tantas opções, como escolher em qual rede social investir?
Cada mídia tem sua peculiaridade, com linguagem e audiência específicas. Há empresas com vários perfis em redes sociais e, em cada perfil, uma maneira diferente de se expressar. No Orkut, as pessoas são mais informais. No Twitter, trabalham mais com notícias, encaminhamento de links. No LinkedIn, as pessoas são mais profissionais. Ali você não vai colocar foto de balada, vai descrever mais a experiência profissional e por aí vai.

Todas essas possibilidades da internet fortaleceram um termo bastante comum nos dias de hoje no mundo corporativo, o marketing viral(1). Quais empresas podem se valer dessa ferramenta?
Não gosto de usar a expressão “marketing viral”, prefiro falar em “comunicação digital que se espalha”. Isso porque é o usuário da mídia quem decide se a informação vai circular em suas redes sociais. O que as agências e empresas fazem é tentar prever ações que incentivem a réplica da informação. O marketing viral vale muito mais para quem trabalha com humor ou para conteúdos extremamente tocantes, que sensibilizem a população. Geralmente, encaminhamos para a nossa rede de contatos tudo que vemos de engraçado na internet, não é? Também passamos para frente histórias de superação, campanhas de responsabilidade social. Eu não acho que qualquer ação de comunicação tenha que ser viral. A gente precisa estudar bem o cliente e o produto para definir se é possível ter impacto junto aos internautas.

A comunicação digital abriu um leque de oportunidades para as empresas. E para os profissionais de comunicação?
É uma chance nova e crescente. Por isso vemos tanta gente nova nessa área, são pessoas que têm mais afinidade com o ambiente virtual. O que não exclui a necessidade de termos profissionais de comunicação experientes envolvidos. Você vai precisar da parte de planejamento, de desenho de estratégia, de avaliação e mensuração dos resultados. O profissional júnior tem mais contato com a ferramenta em si. E isso vale não só para a comunicação, mas também para o setor de TI, de administração, de consultoria.

Voce acredita que todas essas novidades possam culminar com o fim da mídia tradicional?
Acho que está em curso uma mudança na forma como a gente entende a comunicação. Mas não acredito que isso represente o fim da comunicação tradicional. Muito pelo contrário, os apelidos mais seguidos são os mais fortes também na mídia de massa. Eu acredito na complementaridade das duas coisas. Talvez os formatos mudem — o jornal pode não ser exatamente assim, o telejornal será mais interativo, não sei. Mas cada mídia tem sua função.
1 - Mídia contagiosa

O marketing viral é uma ferramenta de publicidade que usa as redes sociais para fortalecer a marca das empresas. A ideia é que as informações institucionais sejam divulgadas na web de forma exponencial, com cada usuário encaminhando e-mails, posts, notícias para seus contatos. Existem diversos pesquisadores que estudam o assunto. Um deles é o norte-americano Henry Jenkins, criador do termo spreadable media, ou mídia “espalhável.
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Reportagem: Carolina Vicentin
Fonte: Correio Braziliense online, 10/05/2010

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