quarta-feira, 28 de julho de 2010

Empresas que não quiserem correr riscos desaparecerão

Estratégia:
Para James Champy, chairman da Dell-Perot Systems,
as companhias precisam focar na inovação para
suportar o avanço da competição global.


Segundo Champy, falta ao Brasil ser visto globalmente como
 fonte de produtos e serviços e
 não apenas como mercado

Não existe mais zona de segurança nos negócios e a melhor época para assumir riscos é agora. As empresas devem inovar e mudar constantemente seus modelos, negócios e processos - e as que não estiverem dispostas a isso correm o risco de desaparecer. O veredito é de James Champy, chairman da Dell-Perot Systems, empresa de sistemas e tecnologia, joint venture da Dell com a Perot-Systems.
Junto com Michael Hammer, ele lançou em 1992 o livro "Reengenharia: revolucionando a empresa em função dos clientes, da concorrência e das grandes mudanças da gerência" (editora Campus/Elsevier), que vendeu mais três milhões de cópias e se tornou um fenômeno no mundo corporativo.
Segundo Champy, o Brasil tem um grande potencial global ainda não atendido, pois é visto apenas como um mercado e não como uma fonte de produtos e serviços, a exemplo da Índia e da China. Prestes a desembarcar no país, onde participará de um seminário da HSM no dia 5 de agosto, ele concedeu ao Valor a seguinte entrevista exclusiva:

Valor: Quais são os maiores desafios que os líderes empresariais enfrentam atualmente? E quais serão no futuro?
James Champy: O maior desafio para os líderes empresariais hoje é a criação do crescimento sustentável. As economias do Brasil, China e Índia parecem melhores em comparação a outros países, mas líderes, trabalhadores e acionistas de todas as partes do mundo estão preocupados em encontrar uma maneira de retornar a um crescimento sólido. Os líderes empresariais precisam se empenhar em suas estratégias e operações, para que elas sejam competitivas. No futuro, a competição vai aumentar conforme as tendências de globalização. As empresas estarão competindo nos mercados globais, onde os custos serão menores e, ainda assim, produzirão produtos e serviços de alta qualidade.

Valor: Qual o tipo de líder que essas empresas globalizadas vão precisar? Que habilidades eles precisam desenvolver?
Champy: Os líderes empresariais globais precisam ser multiculturais e entender o comportamento das pessoas nas regiões em que operam - e isso inclui tanto os clientes como os trabalhadores. Eles também precisam aprender a equilibrar decisões tomadas de maneira centralizada e as decisões tomadas localmente. O modelo em que as decisões são tomadas apenas na matriz já está ultrapassado. Ao mesmo tempo, os líderes devem ser capazes de manter os valores corporativos mais importantes globalmente. Por exemplo, eles não podem aceitar comportamentos antiéticos mesmo que pareçam aceitáveis localmente.

Valor: Em períodos de crise e incertezas, como o que estamos passando, inovar e promover mudanças se torna mais importante?
Champy: Esta é a melhor hora para assumir riscos. O mundo e seus competidores não estão parados. Algumas companhias continuam inovando e estão até mesmo se tornando concorrentes mais fortes. Esta é também a melhor hora para convencer seu pessoal e seus investidores de que a mudança é necessária. Não existe zona de segurança nos negócios hoje em dia. A indisposição para assumir riscos pode ser o começo do encolhimento da empresa.

Valor: Mas há espaço nas organizações para que os funcionários apresentem ideias ou sugestões aos líderes?
Champy: Em uma companhia verdadeiramente inovadora, as ideias surgem tanto de baixo para cima quanto de cima para baixo. Pessoas de toda a organização devem estar engajadas no alto desempenho, criando produtos e melhorando os serviços. Os funcionários da linha de frente são sempre as melhores pessoas para identificar maneiras de uma empresa melhorar suas operações. E uma companhia cujos administradores não dão atenção ao seu pessoal é uma companhia com problemas.

Valor: Como os líderes podem preservar os valores e a cultura da organização em um processo de mudança e inovação?
Champy: As organizações costumam ter culturas e valores fortes, que são destruídos apenas por ações radicais ou líderes negligentes. Esses princípios geralmente são bons e podem ser usados para possibilitar as mudanças internamente.

Valor: Como os líderes podem motivar e inspirar seus funcionários em relação a mudanças na empresa, uma vez que é da natureza humana evitá-las?
Champy: A mudança corporativa pode ser motivada tanto pelo medo quanto pela visão. Eu prefiro que ela seja conduzida pela visão, embora em tempos de dificuldades econômicas muitas mudanças são feitas pelo medo de a empresa quebrar. Mas, mesmo nas crises, um líder forte pode ter uma percepção positiva sobre o futuro e trilhar um caminho de mudança que possa estimular as pessoas. Em alguns ambientes, mudar é difícil devido a práticas de trabalho enraizadas e protegidas. As pessoas, contudo, percebem a necessidade de mudança e a recebem bem, especialmente se melhorar suas vidas no trabalho e a probabilidade de continuarem tendo um emprego no futuro.

Valor: As companhias de todas as partes do mundo estão cientes desse novo cenário nos negócios? E quanto aos líderes e as escolas de negócios?
Champy: Acho que os líderes, no geral, vêm se saindo melhor nos últimos vinte anos. Comecei a trabalhar com executivos quando escrevi o livro sobre reengenharia, em 1992. Muita coisa mudou nos negócios desde então e os executivos se adaptaram bem. As escolas de negócios, por outro lado, vêm se movimentando mais lentamente. É da natureza das instituições acadêmicas serem mais lentas nas mudanças. Mas vejo bons sinais pela frente. A maioria das escolas encoraja os candidatos a trabalhar por dois anos e adquirir alguma experiência prática antes de buscar um MBA. Muitas também exigem agora que os alunos viagem e estudem fora de seus países.

Valor: Como a tecnologia está mudando as práticas de gestão e as relações de trabalho dentro das empresas?
Champy: A tecnologia da informação está afetando dramaticamente as práticas de gestão, mas não os princípios administrativos. Eu acredito que os princípios como o respeito pelas pessoas, uma supervisão financeira sólida e a necessidade da presença física no local de trabalho e no mercado, que Peter Drucker articulou há mais de 50 anos, ainda são válidos. A tecnologia torna as companhias mais transparentes. Os gestores, assim como os clientes, veem muito mais o que está acontecendo dentro de uma empresa agora. Pela internet, elas percebem na mesma hora quando os clientes estão irritados. Além disso, funcionários e líderes estão ligados por meio das redes sociais. Isso significa que os gestores tomam conhecimento e precisam resolver problemas rapidamente.

Valor: Como o senhor vê os líderes empresariais brasileiros e as companhias do país?
Champy: Sempre admirei os líderes empresariais e as empresas brasileiras. Acredito que os administradores brasileiros são sofisticados e muito bons na execução. Mas não estou sentindo o poder do Brasil nos mercados globais, da maneira que venho sentindo a Índia e a China. Os investidores falam de oportunidades na Índia, China e Brasil, mas me parece que o Brasil é visto mais como um mercado do que uma fonte de produtos e serviços. Imagino que o Brasil tem um grande potencial global não atendido.

Valor: Qual é o conselho que o senhor pode dar a um gestor para que ele enfrente os próximos anos?
Champy: Primeiro, concentre-se nos custos e na inovação ao mesmo tempo. Elimine os custos desnecessários de suas operações, mas direcione parte das economias para a inovação. Segundo, concentre-se em seu pessoal. Sou capitalista, mas os benefícios das eficiências e da melhoria do desempenho nos últimos vinte anos foram principalmente para os acionistas. Os engenheiros que projetam produtos e os trabalhadores que os fabricam também precisam participar desses benefícios. Portanto, pense bastante em como recompensar de maneira justa seus funcionários pelo o que eles fazem.
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Por Rafael Sigollo, de São Paulo
Fonte: Valor Econômico online, 28/07/2010

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