sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Livrai-nos do mal


"A RAIZ DOS ABUSOS NA IGREJA ESTÁ NO SEMINÁRIO"

Nos últimos 50 anos, o psicoterapeuta e ex-padre americano RICHARD SIPE(foto) foi considerado o professor de mais de 1000 padres com histórico de envolvimento sexual. Ele diz que os escândalos são apenas o sintoma de uma estrutura esclesiástica que não lida com a sexualidade humana. E que falha no ensino dos sacerdotes. “Há seminários em que até 30% dos formandos acabam abusando de menores” afirma.

O que há na mente dos padres abusadores?
Primeiro, têm uma adaptação social imatura e evitam pessoas. São também voltados à própria satisfação e não identificam o sofrimento de sua vítima. Por outro lado, conseguem passar uma excelente imagem: se vestem de forma impecável, adoram cerimônias e tudo que os coloca no centro das atenções. Mas não têm controle interno. Nem compaixão.

Como lidar com eles?
É preciso mudar o sistema que produz esses padres. É um sistema psicopata que está tão corrompido agora como no século 12. Ela omite os crimes e muda os abusadores de paróquia em paróquia. Assim, mantém pessoas doentes e outras em perigo.
"Abusadores também não devem
mais trabalhar como padres,
pois aproveitam sua condição de conselheiros
para seduzir menores."
Qual a solução para padres abusadores seriais?
Ela deve atacar 3 áreas: criminal, mora – porque a igreja ensina que todo o sexo é pecado – e psiquiátrico. Se houver crime, a pessoa deve ser tratada como um criminoso. Abusadores também não devem mais trabalhar como padres, pois aproveitam sua condição de conselheiros para seduzir menores. E, se precisarem, devem receber medicamentos e terapias. Mas o mais importante é que sejam monitorados. São como os alcoólatras: se quiserem se controlar, há meios para isso. Mas estamos falando mais de controle que de cura.

Como isso pode ser feito?
Acabo de visitar um grupo de 10 ex-padres, quase todos pedófilos, quem moram juntos numa casa sob a supervisão de outros padres. Não foram presos porque seu crime prescreveu, mas vivem confinados. Ali eles tentam reconstruir sua vida espiritual, mas não podem sair sem acompanhamento. O oposto é outro mosteiro que visitei, onde pedófilos podiam pegar o carro e sair sozinhos. A falta de supervisão é desastrosa, pois quem tem tal vício não consegue se controlar.

E qual a proporção de pedófilos no clero?
Coletei dados durante 25 anos (1960-1985) e a conclusão foi que, em qualquer época, não mais de 50% dos padres e bispos praticam o celibato. Uns têm relações sexuais com mulheres, outros com homens. E cerca de 6% se envolvem com crianças. Mas isso aumenta quando você estuda dioceses individuais. Na Arquidiocese de Los Angeles, 11,5% dos padres que trabalhavam em suas paróquias em 1983 foram mais tarde acusados de abuso sexual de menores.

Qual a raiz do problema?
Os padres não são bem preparados nos seminários. Muitos podem se disciplinados nos anos de formação, mas começam a se envolver com adultos ou menores ao mudar para suas paróquias. A questão é que muitas pessoas têm a vocação para ser padre, mas não para o celibato. É aí que o conflito aparece.

A solução é o fim do celibato?
O problema vai além disso: ele reflete todo o ensino da Igreja sobre sexualidade, e o abuso de crianças pelo clero é apenas um sintoma desse sistema.
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Reportagem por Eduardo Szklarz
Fonte: Revista SUPERINTERSSANTE impressa, pg 26, fevereiro/2011

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