sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Trote universitário: ritual de acolhimento ou subordinação

Nair Heloísa Bicalho de Sousa e
Maria Salete Kern Machado
Imagem da Internet
A recepção de calouros tem sido uma tradição na universidade brasileira, imprimindo um ritual de entrada na esfera do ensino superior como expressão da conquista do patamar mais elevado do ensino formal em uma sociedade hierarquizada e desigual. Espaço de conhecimento crítico voltado para a formação de cidadãos conscientes de sua função social, a universidade a cada semestre renova seu compromisso de incorporação dos novos estudantes, na promessa de transformá-los em profissionais competentes e atores sociais e políticos em prol da justiça, da democracia e da luta por direitos.
O caráter hierárquico e autoritário da sociedade brasileira na sua trajetória histórica (CHAUÍ, Marilena. Conformismo e resistência, 1986) trouxe sua marca para dentro da universidade na prática do trote tradicional, que estabelece uma relação desigual entre calouros e veteranos, permeada por brincadeiras humilhantes e opressivas pautadas na subordinação dos primeiros. Este ritual de entrada se propagou ao longo dos anos, moldando atitudes que expressam a presença de hierarquia, competição, egoísmo e agressão, sem contribuir em nada para a idéia de universidade autônoma, republicana e democrática, comprometida com a mudança histórica, o pensamento crítico e a construção de conhecimentos e práticas inovadoras.
Paralelo ao trote tradicional, uma nova maneira de abordar os calouros vem se instituindo nas universidades brasileiras e na UnB: o acolhimento com propostas de práticas solidárias, afetuosas, cooperativas e instigantes. Este convite a entrar na universidade como um lugar onde é possível construir novas idéias, valores e comportamentos a partir de uma convivência fraterna e afetuosa, sem desconhecer os momentos de tensão e conflito como experiências de aprendizagem, abre um novo horizonte de relacionamento interpessoal, social e político.
Arrecadação de alimentos, brinquedos e livros para serem ofertados a entidades educativas vinculadas aos projetos da universidade, doação de sangue, organização de brincadeiras, gincanas e oficinas com crianças e jovens de baixa renda, dentre outras, constituem práticas novas do trote solidário, que passo a passo vai ganhando força na UnB. Ele sinaliza para uma universidade comprometida com a sociedade, em especial com os grupos vulneráveis, capaz de criar vínculos de contribuição efetiva para o amadurecimento pessoal, na medida em que abre os horizontes para o campo da exclusão e da desigualdade social presentes na realidade brasileira.
O NEP (Núcleo de Estudos para a Paz e os Direitos Humanos), em sua longa trajetória centrada na educação em direitos humanos, reconhece a importância desta nova prática para garantir a formação de estudantes-cidadãos/ãs, conscientes da importância de um relacionamento amistoso, tolerante e não discriminatório com os colegas, professores e funcionários no cotidiano da universidade, e do protagonismo do papel acadêmico, social, político e cultural da UnB no Distrito Federal e no país.
A comunidade universitária tem se manifestado a favor de práticas que indicam e demarcam um modo de vida respeitoso, solidário e fraterno o qual vem sendo também partilhado com grande interesse e incentivo pela sociedade.
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Fonte: http://www.unb.br/noticias/10/03/2011

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