segunda-feira, 20 de junho de 2011

ESTE NOSSO BRASIL

Lya Luft*
Imagem da Internet

Não gosto do meu ceticismo e assombro diante de muitas coisas, no que diz respeito ao Brasil, mas eles existem. Cada vez mais me espanto, e cada vez menos acredito. Não funciona, comigo, aquela conhecida frase dos mais velhos “ a mim, nada mais me espanta”. Pois a mim tudo ainda me choca, ou intriga, faz rir ou chorar ou me indignar como sempre, pois, vivendo mais, conheço mais as dores humanas, nossa responsabilidade, nossa miséria, nosso dever de solidariedade, nossa miséria, nosso dever de solidariedade e trabalho, a necessidade de competência e honradez, de exemplo e seriedade. Seja como for, coisas bizarras acontecem neste Brasil nosso tão amado e tão negligenciado. Ao qual faltam, quem sabe, atenção, consciência, indignação, exigência junto dos que nos lideram ou governam, ou representam, educam ou deveriam educar, amparar ou deveriam amparar.

“ACHO QUE ANDAMOS OTIMISTAS
DEMAIS, OMISSOS DEMAIS,
ALIENADOS DEMAIS.
DEVEMOS SER PACÍFICOS
E ORDEIROS, MAS ATENTOS.
APLAUDIR O ERRO É INSENSATEZ,
VALORIZAR O NEBULOSO É BURRICE,
ACHAR QUE TUDO ESTÁ ÓTIMOA
É TIRO NO PÉ”

Outro dia escrevi sobre o tal livro com erros de português, metade aplaude, metade diz que a gente não entendeu nada, ou que é isso mesmo. Autoridades fazem as mais estapafúrdias afirmações. Logo apareceram outros livros escolares com erros crassos. Não são novidades livros escolares com erros crassos e ninguém dava bola. Ninguém percebia, quem percebia ficou na moita, para que se incomodar? O mundo é assim, a vida é assim. O Brasil é assim. Aí eu protesto. O Brasil é bem melhor que isso, mas tem gente que gosta que ele pareça assim, alegrinho, divertido, hospitaleiro e alienado. Afasta preocupações e cobranças, e atrai turistas.

No governo, no Senado, na Câmara, pessoas altamente suspeitas, condenadas ou não, sendo processadas ou não, continuam em altos cargos ou voltaram a eles, e são aplaudidas de pé enquanto nós, os que tentamos ser honestos e pagamos pelo circo todo trabalhando às vezes até o anoitecer da vida e das forças, se não cuidarmos levamos multa cuspida, advertência, punição, ainda que está venha através de impostos cruéis.

Às vezes parece que nem sabemos direito quem nos governa, quem são os líderes, os grandes cuidadores do país. Saber causaria angústia, então fechamos os olhos. Desconhecidos, ou sabiamente ruins, alguns meras promessas, estão em altíssimos postos, parte de nosso destino depende deles.

"...mas um receio difuso,
sombrio, de que estejamos
bailando feito alucinados ou crianças inconscientes à beira de
um abismo disfarçado
 por nuvenzinhas coloridas
chamadas alienações,
para dentro do qual vão escorregando,
ou despencando,
os nossos conceitos
de patriotismo,.."

Nas pesquisas, nas quais nunca acreditei muito, a opinião pública consagra tudo isso na maior naturalidade. E eu me pergunto se realmente observamos, refletimos, concluímos algumas coisas, disso que acontece e tanto nos diz respeito, como o pão, o café, o salário, a vida. Temos uma opinião formada e firme? Lutamos pela honra, pela melhor administração, pela segurança, pela decência, pela confiança que precisamos depositar nos lidere, nos governantes, nos nossos representantes... ou nos entregamos ao fluxo das ondas, interessados muito mais no novo celular, no iPod, ni iPad, no tablet, na fofoca da vizinhança, na troca de geladeira, na TV plana, no carrinho dos sonhos, pago em oitenta prestações impossíveis?

Acho que andamos otimistas demais, omissos demais, alienados demais. Devemos ser pacíficos e ordeiros, mas atentos. Aplaudir o erro é insensatez, valorizar o nebuloso é burrice, achar que tudo está ótimo é tiro no pé. Logo não teremos mais pé para receber a bala, e vamos atirar na cabeça, não do erro, do desmando, da improvisação ou da incompetência, mas na nossa própria cabeça pouco pensante e, eu acho, nestes dias, otimista demais. Sofremos e torcemos pelo nosso país ou, ao primeiro trio elétrico que passa, aos primeiro show espetacular, esquecemos tudo (ser sério é tão chato...) e saímos nos requebrando, e aplaudindo, aprovando sempre, não importa o quê?

Começo a ter medo. Não o medo que temos diante de um cano de revólver ou do barulho de um assaltante na casa, não o medo de que algum mal aconteça às pessoas amadas, mas um receio difuso, sombrio, de que estejamos bailando feito alucinados ou crianças inconscientes à beira de um abismo disfarçado por nuvenzinhas coloridas chamadas alienações, para dentro do qual vão escorregando, ou despencando, os nossos conceitos de patriotismo, decência, firmeza, lucidez, liderança, e uma esperança sem ufanismo tolo.
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* Escritora gaúcha. Tradutora. Prof. Universitária aposentada. Colunista da revista semanal VEJA. 
Fonte: REVISTA VEJA impressa – Ed.222, nº25 – 22 de junho de 2011, pg. 28.

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