quinta-feira, 22 de setembro de 2011

O horizonte de Noé

Ettore Gotti Tedeschi*

Para uma verdadeira solução da crise

Albert Einstein afirmava que a realidade, para poder ser explicada e enfrentada, deve ser simplificada e não tornada ilusoriamente mais simples. Saber simplificar situações complexas é qualidade dos líderes, fazer passar como simples algo que ao contrário é complicado, é defeito dos inexperientes. Hoje intui-se que em todo o mundo ocidental se procura explicar a crise económica de modo aparentemente simples, indicando soluções facilmente realizáveis a curto prazo, mas sem se perguntar se estas presumíveis soluções não podem até agravar a própria crise.
A dívida pública contraída pelos vários países não foi produzida em contextos assimiláveis e portanto não pode ser analisada de modo homogéneo. Na realidade, a sua dimensão, o seu custo e a possibilidade de renovação no vencimento - variantes que preocupam tanto os mercados como os governos - só podem ser reduzidos e absorvidos, numa fase de dificuldade como a actual, com o crescimento da economia. O levantamento fiscal em todas as suas formas, sem uma verdadeira estratégia de crescimento, que de resto está em contradição com o próprio levantamento fiscal, só permite aumentar ulteriormente a despesa pública, inevitável para permitir intervenções económicas na ausência de desenvolvimento. O crescimento, num momento como este, só se obtém com o uso oportuno dos recursos disponíveis, para favorecer as empresas que criam riqueza e ocupação sustentável, pagam os impostos e assim permitem absorver a dívida.
"Saber simplificar situações complexas
 é qualidade dos líderes, fazer passar
como simples algo que
ao contrário é complicado,
é defeito dos inexperientes."
Tributos patrimoniais, novos impostos ou sucedâneos semelhantes, durante uma crise prolongada, reduzem ou anulam os recursos para os investimentos, desencorajam a confiança dos investidores, penalizam o custo da dívida pública e as possibilidades de renovação no seu vencimento. Neste contexto, impor taxas sobre o património e a renda equivale a uma contra-subsidiariedade suicida do Estado em relação ao cidadão. Quem possui patrimónios lícitos, sobre os quais pagou justos impostos, contribuiu para criar riqueza e, precisamente graças a eles, continua a produzi-la com investimentos e consumos.
Ulteriores levantamentos fiscais não seriam sinónimo de solidariedade, mas só de uma maior despesa pública e talvez de uma dívida mais alta e de uma pobreza mais difundida. Tributos elevados penalizam a poupança, geram desconfiança na capacidade de estimular a retoma, sacrificam as famílias, impedem a formação de novos núcleos familiares e criam incerteza e precariedade do trabalho. Em síntese, lançam os pressupostos para uma outra fase de desenvolvimento não sustentável. Esta é a realidade a explicar, evitando, para o dizer com Einstein, ilusórias simplificações. Cada obra importante, para ter êxito, deve ser clara no contexto, nos objectivos, nos recursos necessários e na sua organização. Portanto, as soluções globais autênticas da crise devem ter em consideração o que a originou, a sua amplitude, o tempo e os meios necessários para a resolver. Ou seja, é necessário alcançar um horizonte mais vasto. Como faz Noé que, elevando o olhar, conseguiu ir além de si mesmo e salvar a humanidade.

OBS.: Texto digitado em português de Portugal.
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* ETTORE GOTTI TEDESCHI (Presidente do IOR)
Fonte: (© L'Osservatore Romano - 3 de Setembro de 2011)
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