segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Um pecado que serve a um objetivo maior

Por JOHN TIERNEY
A inveja parece ser o mais inútil dos pecados mortais: terrível de experimentar, vergonhosa de admitir, desprovida de prazer imediato ou benefícios em longo prazo. Para um psicólogo evolucionista, existe uma certa lógica em seduzir a mulher do vizinho ou roubar seus bens, mas de que adianta apenas cobiçá-los?
Experimentos da Universidade Cristã do Texas em Fort Worth e na Universidade do Texas em Austin revelam um lado positivo.
A inveja envolve um desejo por algo que você não tem; o ciúme nasce da perda de algo para outra pessoa. Se você deseja uma mulher como Angelina Jolie, você inveja Brad Pitt; se você teme perder sua mulher para ele, o que você sente é ciúme.
Em um experimento, pediu-se a estudantes que escrevessem sobre ocasiões em que eles invejaram um amigo. Então, juntamente com um grupo de controle que não foi solicitado a lembrar experiências de inveja, eles leram entrevistas com duas pessoas supostamente matriculadas em sua escola. Nessas entrevistas fictícias, os participantes responderam a perguntas sobre seus estudos e objetivos, mas não disseram nada que provocasse inveja.
Comparados com o grupo de controle, os estudantes passaram mais tempo estudando as entrevistas e foram melhor em lembrar detalhes dessas duas pessoas. O simples fato de lembrar sua inveja de antigos rivais aparentemente os fazia prestar mais atenção nos atuais pares, mesmo que não houvesse nada ameaçador neles.
Os pesquisadores Sarah E. Hill e Danielle J. DelPriore, da Cristã do Texas, e Phillip W. Vaughan, da Universidade do Texas, então mostraram aos estudantes seis entrevistas de jornal falsas e fotografias de outros supostos estudantes. As mulheres viram fotos de mulheres, enquanto os homens viram fotos de homens. Nas fotos, alguns estudantes fictícios eram atraentes, outros não. Um mencionou que tinha uma nova BMW; outro dirigia um calhambeque. Um tinha um pai no conselho diretor da escola; outro recebia ajuda financeira para estudar.
Os pesquisadores perguntaram aos estudantes sobre suas emoções e mediram quanto tempo eles estudavam o perfil do outro. Eles passavam mais tempo contemplando aqueles pelos quais manifestavam inveja: os estudantes bonitos e ricos. E mais tarde puderam lembrar melhor os nomes e detalhes dos "alvos de muita inveja".
Os resultados mostram que a inveja pode "evocar uma cascata funcionalmente coordenada de processos cognitivos", como dizem os pesquisadores na edição de outubro do "The Journal of Personality and Social Psychology".
As mulheres apresentavam maior probabilidade que os homens de sentir inveja de uma colega fisicamente atraente, resultado coerente com as teorias dos psicólogos evolucionistas sobre a beleza importar mais às mulheres para o sucesso reprodutivo.
A riqueza importa mais para o sucesso reprodutivo dos homens, mas neste experimento não houve diferença entre os gêneros.
Isso poderia demonstrar, como notam os pesquisadores, que a "natureza intercambiável do dinheiro" o torna valioso para o sucesso reprodutivo de ambos os sexos. "Os homens não ficariam tão preocupados com a aquisição de recursos se as mulheres não gostassem tanto de recursos", disse o doutor Hill.
A nova evidência é importante porque demonstra claramente que a memória e a atenção estão ligadas à inveja, disse Richard H. Smith, editor de "Envy" (Inveja), um compêndio de pesquisas de 2008. O estudo também sustenta uma antiga ideia sobre esse vício.
"Tradicionalmente, a inveja está ligada aos olhos", ele disse. A palavra vem do latim "invidere", que significa olhar com malícia, ou projetar um "mau-olhado".
Mas outros, como o psicólogo holandês Niels Van de Ven, definem a inveja de duas maneiras. Existe a "inveja benigna", em que você presta atenção nos superiores para imitá-los; e a "inveja maliciosa", em que você presta atenção para encontrar fraquezas que os rebaixem ao seu nível.
A inveja exige esforço mental. Em um experimento, após contemplar um colega rico e atraente, os estudantes trabalharam em quebra-cabeças. Comparados com um grupo de controle, eles desistiram do desafio mais cedo.
Foram vítimas do "esgotamento do ego", um estado de fadiga mental. A inveja pode aguçar seu olhar e melhorar sua memória, mas cobiçar é um trabalho duro.
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Fonte: Folha de S.Paulo - The New York Times, 24/10/2011
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