quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Comentário ao “O que cobrar ao capitalismo neoliberal em crise

Leonardo Boff* 

 

No site de ENVOLVERDE de 14/08/2012   Eloy Fenker publicou um comnetário ao meu artigo “O que cobrar ao capitalismo neoliberal em crise”. Traz dados e reflexões que merecen sem democratizadas pois enriquecem o que escrevi. Toda nossa geração deve empenhar esforços para obviar os riscos que nos cercam e manter o horizonte da história aberto para frente. Agradecemos ao Fenker esta contribuição; LB

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    Muito pertinente e equilibrada a posição de Frei Boff. Mas quem está disposto a pagar a conta da preservação ?
    Fica evidente que os países ricos são os grandes consumidores de recursos naturais, os maiores poluidores, os maiores beneficiários dos frutos do crescimento econômico. E gastam bilhões para salvar o seu sistema financeiro, deixando morrer milhões de pessoas por ano em todo o mundo! Uma injustiça distributiva de grande proporção. Gostaria de enfatizar que estes ricos, para continuarem ricos, impõem aos pobres os ônus da preservação. E, pior de tudo, sem remuneração. E com sensação de que somos culpados pelo estado de coisas. Eles espalham pelo mundo afora, por meio de suas ONGs (criadas e mantidas por nações e corporações dominantes) o terrorismo ambiental.
     
    Aqui no Brasil isto está sendo levado ao extremo. Por que há tanto destaque na mídia sobre os aspectos ambientais negativos do Brasil, e pouco se fala sobre os aspectos positivos ? O Brasil é o país líder – com folga – na preservação ambiental no mundo. Se fossem computados os valores reais dos recursos naturais preservados e dos serviços ecossistêmicos pelos países pobres e também exportados aos países ricos e se os países ricos tivessem de pagar por isso, os pobres de hoje ficariam ricos e os ricos ficariam pobres. Isto contraria toda a lógica econômica, então é pouco provável que tenha acontecer.

    O relatório Planeta vivo da WWF (2012) indica que 10 países (ali incluídos 5 países do BRIICS) detinham, em 2008, 60% da biocapacidade ( capacidade de regeneração dos ecossistemas) do planeta. O Brasil, segundo o relatório é o país mais limpo do mundo, e possui, sozinho, 15,4% de toda a biocapacidade do planeta, sendo nossa capacidade per capita de 9,63 gha (hectares por habitante), para uma pegada ecológica de 2,93 gha; Europa ocidental apresenta uma pegada ecológica de 4,72 gha e biocapacidade de 2,24 gha; o Japão, pegada de 4,17 e biocapacidade de 0,59; America do Norte pegada de 4,72 para 2,24 gha de biocapacidade. Observem no relatório que o maior superavit é do Brasil, com 229 de superávit.

    O serviço ambiental que prestamos, anualmente, vale US$5 trilhões, mas ninguém quer pagar. Os países ricos não pagam ao Brasil. O Brasil não paga aos preservadores. Uma das sugestões deste relatório da WWF (que me parece estar a serviço dos ricos e dominadores) é de que seja forçoso concluir que a biocapacidade sobrante dos países (pobres) seria mais bem aproveitada se exportada e utilizada por outras nações. Os residentes nos países ricos são dependentes dos recursos de outras nações para atender suas necessidades e como os recursos estão escasseando, a competição está crescendo.
    A disparidade entre as nações ricas em recursos e as nações pobres em recursos muito provavelmente terão grandes implicações geopolíticas no futuro, diz o relatório (WWF, 2012). Se o capital natural é o que vale para o futuro, acho que vai se alterar o poder, pois os pobres de hoje que detém o capital natural serão ricos amanha, e os ricos de hoje, pobres. Então, os ricos atuam na causa ambiental para impedir os pobres de usarem estes recursos, ou forçá-los a vender sem incorporar as externalidades ambientais, sobe pena de ficarem ricos. Por isso, o Brasil tem 79% de seu território protegido como Reserva Legal, APP, Unidades de Conservação e Terras Indígenas (Embrapa/ISA/MMA/FUNAI).
    Áreas indígenas………..1.126.939 km2………………. … 13,2 % (Funai)
    Ucs……………………….1.513.309 km2……………… ……17,71 %(MMA)
    RL………………………..2.685.542 km2…………………….31,54 % (Embrapa)
    APPS………………………1.442.544 km2…………………..16,94 %(Embrapa)
    TOTAL PRESERVADO SEM ENTORNO UCS…………….. 79,39 %
    Entornos – estimativa cenário de 10 km …………………7,42 %
    TOTAL PRESERVADO COM ENTORNO 10 km…………..86,81 %
    Área utilizável sem entornos Ucs…………………………20,61 %
    Área utilizavel com entorno 10 km……………………….13,19 %

    No entanto, há plano de aumentar mais e mais a proteção, conforme reivindicação dos ambientalistas. No dia 14/6/2012 (O Estadão) a Presidente Dilma Roussef acusou Ongs internacionais de fazerem “acusações socioambientais” contra o Brasil, naquilo que qualificou de “praticas fraudulentas de competição”, em favor de interesses estrangeiros, especialmente na área de energias limpas. Com isso, perdemos oportunidade de melhorar a distribuição interna, continuamos fornecendo matéria-prima aos ricos e não recebemos pelos serviços ambientais que prestamos.
    Se as grandes corporações internacionais exploram o Brasil, internamente, no Brasil, ocorre o mesmo: o país explora os preservadores. O produtor rural é quem preserva e cuida da natureza mas nada recebe, permanecendo como escravo, e ainda acusado de desmatar, é punido por preservar. E se sua área é expropriada, nada recebe. A criação de Unidades de Conservação (UC) no Brasil, por sua vez, esta sendo feita em escala fantástica, incentivada e financiada por ONGs internacionais (dinheiro que vem de onde? ), sem que no entanto os proprietários sejam indenizados, com conivência do executivo e legislativo (tem corrupção no meio??). E, pior, são “parques de papel”, porque o governo cria UCs em áreas privadas, não vem indenizando aos proprietários, não toma posse, não possui domínio, deixando-as abandonadas.

    O Passivo fundiário brasileiro de criação de Unidades de Conservação Federais é impagável, inadministrável, é de 21 milhões de hectares(MMA), representando 2,5% do território nacional. Quando valem as áreas assim protegidas, ou 2,5% de nosso território mais valioso? . O MMA diz que a dívida fundiária de 21 milhoes de hectares é de R$20 bilhões, ou seja, compra-se todo o território nacional mais valioso por R$800 bilhoes, uma bagatela! Se traduzidos pelo real valor dos recursos ecossistêmicos, de R$150 mil por hectare de áreas de alto valor ecológico (por exemplo: Costanza ou pela avaliação eMergética), daria um passivo fiscal da ordem de R$ 3 trilhões (TRES TRILHOES DE REAIS!!) e nosso território todo poderia ser vendido por R$120 trilhões.

    Como escreve Carasco, no livro Mafia Verde, o Ambientalismo a Serviço do Governo Mundial, Rio:Ed. Capax Dei, no Brasil o ambientalismo está a serviço de um colonialismo que nos é imposto, utilizando-se das Ongs e do comando das diretrizes e políticas públicas.

    A idéia de proteger é boa, e devemos fazer. Mas alguém, os que desmataram tudo, que se beneficiam dos serviços ambientais, deveriam pagar esta conta. Mas ninguém quer pagar, impondo este serviço público ao proprietário individual, que não tem recursos para prestar serviço escravo, ou seja, sem remuneração alguma.

    Para os que defendem a proteção – e eu concordo – fica a pergunta: Quem paga a conta ? Continuaremos a ser colônia, prestando serviços sem remuneração, em favor dos que destruíram para se tornarem potencias econômicas? E internamente continuaremos a explorar o trabalho escravo dos proprietários que preservam a natureza e prestam o serviço ambiental sem remuneração?
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    Fonte:  http://leonardoboff.wordpress.com/2012/08/14/
     

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