sábado, 22 de setembro de 2012

“A sociedade começará a falar mais sobre a morte”

Entrevista

Jeferson Piva, médico

Um dos responsáveis por criar a resolução do Conselho Federal de Medicina, o médico Jeferson Piva integra a Câmara Técnica que discutiu o tema na entidade.
Na entrevista a seguir, o especialista fala como a medida irá interferir na relação entre médico-paciente quando a vida está no fim.

Vida – Como a decisão modifica a relação médico-paciente?

Jeferson Piva – Se olharmos o Código de Ética, vamos ver que há vários pontos falando que os médicos devem respeitar a autonomia dos cidadãos. Ou seja, escutar e estar de acordo com o paciente sobre as técnicas executadas. Na prática, isso já acontece há muito tempo. O que mudou é que, antes, as pessoas tinham um médico que conhecia bem o paciente. Hoje, pouco se conhece, pois são vários especialistas. O que a resolução acrescenta é que leva as pessoas a pensarem sobre isso e comuniquem seus médicos. Hoje, a perspectiva é de que se tenha uma vida longa, que dentro do possível seja boa. O final, no entanto, pode ser doloroso. O melhor é que o desejo do paciente seja registrado. Fica mais fácil para o médico tomar a decisão.

Vida – Que importância tem a resolução?
Piva – A sociedade vai falar sobre a morte. A gente nasce com a certeza de que vai morrer, mas pouco fala sobre o assunto. Quando deparamos com essa situação, não sabemos como reagir. O que está sendo proposto é que se gere uma reflexão. Isso representa uma maturidade social para o Brasil.

Vida – Tem alguém que, legalmente, está posicionado contrário à medida?

Piva – Até agora, não. Nosso grande receio é que isso se tornasse uma manobra legalista, que a pessoa tivesse que ir ao cartório, com o advogado. A proposta é simples: que fique o registro no prontuário, sem necessidade de assinatura do paciente. A família precisa estar ciente. Essa medida deu uma dimensão prática para o tema e evitou a burocracia. Se nós tivéssemos enveredado pelo campo jurídico, ia complicar mais, ia trazer atores que não fazem parte do processo.

Vida – E quando a decisão da família diverge daquela do paciente?

Piva – É um problema. Nem sempre a família está preparada para acatar a decisão do paciente. Às vezes, situações como o interesse por uma herança ou um casamento desfeito podem influenciar na decisão. Por isso, ela deve ocorrer antes de o paciente estar na fase terminal. Se a família diverge, discutimos entre a equipe médica, podendo também recorrer à equipe de bioética, psicólogos ou a comissão de ética. Fazemos tudo para evitar que a decisão seja tomada na porta da UTI.
 
Vida – Caso não concorde com a decisão, a família pode recorrer judicialmente?

Piva – A vontade suprema é a do paciente. Mas se ele não deixou testamento vital e a família não entrou em consenso, é possível que a situação tenha repercussão na justiça. Porém, essa não é a tradição do nosso país. Nos Estados Unidos, isso ocorre com frequência. A forma de gerenciar essa situação é, em primeiro lugar, evitar o conflito. Segundo, buscar o diálogo com a família e se for preciso, mudar a decisão.

Vida – E como ocorre quando a decisão do paciente vai contra a ética médica?

Piva – Se o paciente pede para eu dar uma injeção letal quando ele sentir dor, não posso acatar seu pedido. Isso é eutanásia, é um crime e vai contra a moral da Medicina. Tudo o que for contra o código de ética, não pode. Dentro das opções éticas, paciente e médico escolhem a melhor. Queremos que as pessoas passem a pensar sobre a sua morte e a comunicar isso para seus médicos

Detalhe

O que é um paciente terminal?

De acordo com a Organização Mundial da Saúde, paciente terminal é aquele que tem entre três e seis meses de vida. Ou seja, a medicina caracteriza como terminal aquele paciente que, utilizando todo tipo de tratamento disponível, não tem perspectivas de sobreviver.
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Fonte:  http://www.clicrbs.com.br/zerohora/22/09/2012
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