Luciano Martins Costa*
A notícia é apresentada pela Folha de S. Paulo de quarta-feira
(5/9), em tom triunfalista: “Nunca as pessoas leram tanto jornal no
mundo”, diz o texto. E explica: impulsionada pela leitura em novas
plataformas digitais, como tablets e smartphones, a circulação global
dos jornais aumentou 1,1% em 2011”.
A informação, retirada do relatório anual “Tendências da Imprensa
Global”, publicado pela associação mundial de jornais, conta apenas
metade da história: de fato, a leitura de material jornalístico aumentou
globalmente em relação a 2010, mas apenas por causa do interesse
crescente de informações por parte das populações da Ásia, Norte da
África e Oriente Médio.
Na América Latina, a circulação de jornais caiu 3,3%, na Europa
diminuiu 3,4% e na América do Norte, a queda foi de 4,3%. Nos últimos
nove anos, período em que a região consolidou sua posição de maior
destaque na economia mundial, a Ásia viu aumentar em 16% a circulação de
jornais, tornando-se responsável por um terço da tiragem mundial,
enquanto a imprensa da Europa Ocidental e da América do Norte
apresentava uma perda de 17% em seu público.
No âmbito global, a leitura cresceu tanto sobre a base tradicional de papel quanto nas novas plataformas digitais móveis.
Redes sociais
Em todo o mundo, mais de 2,5 bilhões de pessoas leem jornais de papel
pelo menos uma vez por semana e 600 milhões acessam notícias online.
Desses leitores via internet, 500 milhões combinam a leitura no papel
com o acesso aos meios digitais, e 100 milhões leem os jornais apenas na
versão digital.
As contas indicam que mais de 40% da audiência global da internet se
dirige para o conteúdo jornalístico online, o que representa um aumento
de 34% sobre os números da pesquisa anterior, referente a 2010. No
entanto, essa audiência tem pouca intensidade e frequência: nos Estados
Unidos, por exemplo, cerca de 7 entre 10 internautas acessam conteúdos
jornalísticos, mas apenas 17% deles o fazem habitualmente, ou seja,
todos os dias.
Essa falta de intensidade reduz o valor dos sites jornalísticos como
mídia, o que impede o aumento da receita com publicidade, na avaliação
do presidente da associação mundial de jornais.
Os números apresentados pelo estudo induzem a algumas considerações:
uma delas é o fato preocupante de que a maior parte dos resultados
financeiros das empresas jornalísticas continua dependendo das edições
impressas, sendo que a venda de jornais responde por cerca de metade dos
lucros. Outra observação é que a receita de publicidade dos jornais
continua caindo sem parar desde 2007.
Como a publicidade online global cresceu nesse período, de US$ 42
bilhões em 2007 para US$ 76 bilhões em 2011, pode-se concluir que as
empresas jornalísticas estão perdendo essa oportunidade. De fato,
segundo o relatório, apenas 2,2% da receita de publicidade dos jornais
em 2011 veio das plataformas digitais.
O conjunto de números mostra uma tendência muito clara: o leitor é
móvel, crítico e conta com muito mais alternativas para se informar.
Faltam estudos que comprovem outras suposições, como a de que os
usuários de aparelhos móveis de comunicação com acesso à internet buscam
informações mais específicas ao mesmo tempo em que procuram participar
dos chamados “hipes”, ou temas quentes de cada dia. No entanto, para
opinar sobre determinados assuntos que demandam mensagens curtas, a
tendência é que os usuários desses aparelhos optem por utilizar as redes
sociais digitais, dispensando a passagem pelos portais jornalísticos.
Perigoso paradoxo
Esse cenário tende a se consolidar, a se considerar o movimento que se
produziu apenas três anos após o lançamento do i-Pad. Segundo o
relatório da associação mundial de jornais, nesse período os novos
aparelhos tipo tablet ou smartphone se transformaram em plataforma
básica de comunicação.
A pesquisa constatou que 6 em cada 10 usuários de tablets abandonaram
as outras formas de acesso a conteúdo informativo. Mais da metade desses
usuários afirma que costuma acessar notícias diariamente, e 30%
declaram que passaram a dedicar mais tempo a conteúdo jornalístico
depois de adquirir o aparelho.
Se a tecnologia oferece essa janela de oportunidade para as empresas
jornalísticas atenderem essa demanda por informação, qual seria o motivo
das dificuldades em monetizar essa audiência?
Talvez seja o caso de se repensar o modelo de negócio. Ou começar a
desconfiar que a qualidade do jornalismo oferecido ao público não tem as
características que esse público exige.
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* Jornalista. Escritor.
Fonte: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/muito_leitor_pouca_receita
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